“A Vida Não Me Assusta”: a união de Maya Angelou e Basquiat

A Vida Não Me Assusta

Tem cara de livro de criança, é publicado por um selo infantil, é vendido como um livro para crianças, mas é muito mais do que isso. Essa poderia ser uma descrição perfeita para o clássico “A Vida Não Me Assusta”, uma junção belíssima entre a poesia de Maya Angelou e a arte de Jean-Michel Basquiat.

Com uma reedição impecável da Darkside Books e o seu selo Caveirinha, o livro “A Vida Não Me Assusta” já foi lançado há 28 anos, mas a edição que encontramos hoje no mercado foi lançada pensando na comemoração dos 25 anos da data do lançamento do original, em 1993.

“A Vida Não Me Assusta”: conheça mais sobre a história da obra

Para quem é fã do trabalho a dupla Angelou e Basquiat a obra é um prato cheio, uma mini obra de arte para ter em casa e deleitar os olhos e o coração. Pensar que dois grandes nomes possam ter se encontrado para pensar nesse livro é lindo, mas não foi isso que aconteceu (o que em nada retira qualquer mérito da obra).

“A Vida Não Me Assusta” é uma criação de Sara Jane Boyers, autora e editora natural da Califórnia. Sara conta que no início dos anos 90, assustada com a desvalorização da arte contemporânea e inspirada pelos próprios filhos, teve a ideia de fazer livros para crianças que envolvessem poesia e artes visuais, duas das suas paixões. A ideia era integrar as duas linguagens para criar “novas histórias” e estimular a curiosidade dos pequenos leitores. Pensando nisso, os livros contariam também com material biográfico informativo sobre os artistas, assim como uma lista de museus onde seria possível encontrar as obras de arte retratadas.

Boyers conta que começou a escolha pelo artista: Jean-Michel Basquiat: o nova-iorquino de ascendência porto-riquenha e haitiana, consagrado inicialmente por seus grafites e mis tarde por suas telas neoexpressionistas. Com uma ascensão meteórica nos anos 80, Basquiat era ousado, inovador e excêntrico que infelizmente não resistiu ao cenário artístico frenético daquela década e faleceu em 1988, aos 27 anos, por causa de uma overdose.

Sara reuniu muitos livros com reproduções das obras do artista, selecionou várias e partiu em busca de um poema que fizesse sentido para o que estava vendo. Depois me muito procurar, encontrou numa antologia de poesia o poema de Maya Angelou, escrito em 1978, que dá nome ao livro: “A Vida Não Me Assusta”. A autora, nascida no Missouri e criada pela avó no Arkansas, teve uma infância difícil, permeada pela segregação e discriminação racial, e recheada de literatura com nomes como Mark Twain e Shakespeare. Aos 7 anos foi vítima de violência sexual e isso a fez escolher o silêncio por 5 anos. Quando voltou a falar, decidiu que tinha muito o que dizer. Maya atuou diretamente na luta pelos direitos civis dos negros e foi amiga de personalidades como Martin Luther King e Malcolm X (sendo a responsável por intermediar um diálogo e aproximação entre os dois, que possuíam abordagens distintas para a mesma luta). A autora faleceu em 2014 sem nunca ter deixado de espalhar a sua mensagem.

Boyers então relata que cortou os versos de Maya em tiras e foi montando e experimentando como eles ficavam por cima das imagens de Basquiat. Conta ainda que ficou feliz quando viu a repercussão e de que a obra não ficou restrita apenas à categoria infantil, mas que navega e dialoga também com jovens e adultos e que isso é o que importa, que cada um retire do livro a mensagem que for melhor para si, porque a arte nada mais é do que algo “expressivo, individual e impactante”.

Em “A Vida Não Me Assusta” temos então um poema potente sobre a importância de ser corajoso, de não ignorar os seus medos e enfrentá-los e as imagens únicas de um artista que se inspirava na street art para pensar a sua criação. É importante lembrar que com a tradução talvez uma parte do sentido do poema tenha se perdido, mas em nada isto altera a mensagem final. Para crianças pequenas, uma leitura dirigida é recomendada.

Uma união inusitada, mas que faz todo o sentido, se formos olhar o percurso de ambos. É daqueles livros para ter na estante e passar como herança através das gerações.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Scroll to top